Antidepressivos podem aumentar risco de demência em idosos

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Exposição a antidepressivos e risco de demência

A demência é caracterizada por um declínio cognitivo e um comprometimento das atividades cotidianas, trazendo uma alta carga financeira para a sociedade, além de ser uma importante causa de incapacidade e de morte. Cerca de 5% a 6% das pessoas acima dos 60 anos apresentam algum tipo de demência; e estima-se que o número de casos irá duplicar até 2040. Isto faz com que fatores modificáveis na prevenção da demência tenham uma importância cada vez maior e sejam uma prioridade para as autoridades de saúde.

Estudos mostram que a prevalência da depressão maior entre os idosos é de 1,8%, e tem se demonstrado um fator de risco/pródromo de demência. Além disso, embora pesquisas tenham demonstrado que a eficácia dos antidepressivos é limitada nesta população, este tipo de medicamento ainda é muito usado.

Hipóteses antagônicas existem, associando o uso de antidepressivos e o risco de demência. A primeira postula que a maioria dos antidepressivos possuem efeitos anticolinérgicos e estes efeitos prejudicam as funções cognitivas, aumentando o risco para demência. A segunda hipótese relaciona os antidepressivos ao BDNF, efeitos anti-inflamatórios, neurogênese hipocampal e modulação da ativação da glia, fazendo com que o risco de demência diminua.

Poucos estudos examinaram a associação entre o uso de antidepressivos e o risco de demência. A maioria deles mostra um aumento do risco, mas existem exceções. Além disto, o uso de antidepressivos não modificou o curso da alteração cognitiva em um estudo. Em outro estudo o uso de longo prazo de antidepressivos tricíclicos foi associado a uma redução do risco. A disparidade dos resultados pode ser explicada pela diferença nos desenhos dos estudos. A maioria deles não fizeram os devidos ajustes nos modelos de regressão.

O objetivo deste estudo foi testar a hipótese de que o uso dos antidepressivos pode estar associado a um aumento ou diminuição do risco de demência em pessoas com idade acima dos 60 anos. Para isto, foi usada uma coorte prospectiva israelense pareada (N = 71.515) com pessoas acima dos 60 anos, sem demência, seguidas desde maio de 2013 até outubro de 2017. Destes, 67.827 não foram expostos a antidepressivos e 3.688 foram expostos a antidepressivo em monoterapia. Foi usada a regressão cox.

Na análise primária o HR foi de 4,09 (IC 95%, de 3,64 a 4,60) e o ajustado foi de 3,43 (IC 95%, de 3,04 a 3,88). Foram feitas 24 análises de sensibilidade para analisar a taxa de risco, e os valores de HR variaram entre 1,99 e 5,47.

Para lembrar:

Este estudo mostra um aumento do risco de demência em pacientes idosos em uso de antidepressivos em monoterapia. Um bom diagnóstico diferencial nesta população é necessário, pois nem sempre os primeiros episódios depressivos dos pacientes são episódios de depressão maior; podem ser sintomas relacionados com doenças orgânicas, como doença de Parkinson ou Alzheimer, por exemplo. Outra possibilidade é um episódio de depressão bipolar em pacientes que já convivem com um dos três principais temperamentos (ciclotimia, distimia, hipertimia).

Canabinoides para o tratamento de doenças mentais e seus sintomas: uma revisão sistemática e metanálise

Alguns países estão permitindo a comercialização de canabinoides para uso medicinal, inclusive para o tratamento de doenças mentais. Os autores do trabalho analisado usaram o termo Cannabis medicinal para se referir a qualquer parte da planta Cannabis. Usa-se o termo canabinoide farmacêutico para se referir a qualquer categoria de extrato medicinal contendo tetrahidrocanabidiol (THC) com ou sem canabidiol (CBD). Devido ao grande interesse por produtos com CBD para o tratamento de diversas doenças, os pesquisadores agruparam separadamente os estudos que usaram apenas CBD.

Depois da dor crônica, a doença mental é a razão mais comum para o uso de canabinoide medicinal. Existem algumas hipóteses para explicar por que o endocanabinoide reduz os sintomas depressivos, além dos emocionais e cognitivos no transtorno de estresse pós-traumático (TEPT). Muitas pesquisas reportam aumento do uso de Cannabis entre pessoas com depressão, ansiedade, TEPT e psicose (em todos os casos como automedicação).

Uma revisão de cinco estudos randomizados controlados sobre doenças mentais, feita em 2015, concluiu que o canabinoide medicinal não apresentou efeito em psicose e depressão. Outra revisão, feita em 2016, incluiu 40 estudos randomizados sobre canabinoide medicinal para o tratamento de TEPT, doença de Tourette e doença de Alzheimer. Não foi possível identificar estudos randomizados controlados sobre nenhuma condição, consequentemente nenhuma conclusão foi possível sobre a eficácia. Até o momento, nenhuma revisão considerou todos os tipos de evidências, os diferentes potenciais relacionados com os diferentes tipos de canabinoides medicinais.

Este estudo examina as evidências de todos os tipos de canabinoide medicinal e todos os tipos de estudos (controlados e observacionais) para averiguar o impacto do canabinoide medicinal na remissão de sintomas de depressão, ansiedade, TEPT, psicose, transtorno de déficit de atenção e/ou hiperatividade (TDAH) e síndrome de Tourette. A revisão também avaliou a segurança do canabinoide medicinal para saúde mental.

Participaram desta revisão pacientes acima dos 18 anos tratados com canabinoide medicinal para depressão, ansiedade, TDAH, transtorno de Tourette, TEPT ou psicose. Não houve restrição com relação à língua ou ao tipo de estudo. O desfecho primário foi remissão e alteração nos sintomas destas doenças mentais. A qualidade dos estudos foi avaliada por meio da escala GRADE.

No total, foram incluídos 83 estudos, sendo que alguns se sobrepõem nos diagnósticos. Destes, 40 eram randomizados (N = 3.067); 42 eram sobre depressão (23 randomizados; N = 2.551); 31 eram sobre ansiedade (17 randomizados; N = 605); 8 estudos eram sobre síndrome de Tourette (2 randomizados; N = 36); e 3 eram sobre TDAH (1 randomizado; N = 30). Foram incluídos 12 estudos sobre TEPT (1 randomizado; N = 10) e 11 sobre psicose (6 randomizados; N = 281).

Houve melhora da ansiedade entre indivíduos com dores crônicas e esclerose múltipla, no entanto as evidências GRADE foram baixas. O uso de THC farmacêutico piorou os sintomas negativos nas psicoses em um dos estudos. Além disso, o THC farmacêutico não afetou nenhum desfecho primário entre outras doenças mentais, mas aumentou o número de pacientes com efeitos colaterais (OR = 1,99; IC 95%, de 1,20 a 3,29). Também houve um aumento no abandono dos estudos devido aos efeitos colaterais em comparação com o placebo (OR = 2,78; IC 95%, de 1,59 a 4,86).

Para lembrar:

Esta revisão sistemática e metanálise revela evidências escassas sobre a melhora dos sintomas citados quando tratados com canabinoides. O trabalho não apresenta evidências contundentes de que o THC farmacêutico melhore os sintomas de ansiedade entre indivíduos com outras patologias. Sendo assim, a prescrição deste tipo de medicamento ainda é precoce para qualquer um destes sintomas psiquiátricos. Outro ponto importante revelado pelo estudo foi o aumento dos efeitos colaterais, portanto, deve-se ter muito cuidado ao prescrever canabinoides para pacientes com quadros psiquiátricos.

Recente aumento de sintomas depressivos entre adolescentes norte-americanos: análise de tendências de 1991 a 2018

Evidências sugerem que a incidência de sintomas depressivos entre jovens norte-americanos permaneceu estável entre os anos 60 e 90, no entanto, cada vez mais evidências indicam que a prevalência deste tipo de sintoma tem sido maior nesta população nos últimos anos.

Um estudo reportou um aumento de 8,7% (em 2005) para 12,5% (em 2015) da prevalência de depressão maior entre adolescentes nos Estados Unidos. A incidência de casos de suicídio entre meninas de 10 a 14 anos quase triplicou de 1999 para 2014. Outro dado importante é que, a partir dos anos 90, o uso de medicamentos para tratar transtornos do humor em adolescentes ou adultos aumentou substancialmente.

Alguns estudos transversais e prospectivos têm indicado uma certa estabilidade na incidência de sintomas depressivos, mas a maioria desses trabalhos se concentra em adultos, e não inclui dados recentes de adolescentes. As últimas evidências mostram que não houve aumento da incidência de sintomas depressivos entre adolescentes, mas, na última década, houve uma rápida mudança do ambiente em relação a tecnologia (incluindo mídias sociais) e saúde (diminuição de horas de sono, obesidade e outras alterações que possam influenciar nos sintomas depressivos).

O aumento da incidência de sintomas depressivos pode indicar que fatores de risco ambientais estão aumentando em prevalência ou magnitude, além de ser um novo problema a ser abordado. Este estudo buscou abordar o hiato que existe em relação a incidência de sintomas depressivos em adolescentes, para isso, os pesquisadores utilizaram dados de 1991 a 2018 do estudo “Monitorando o Futuro”. Foi usada uma pesquisa transversal do oitavo, décimo e do décimo segundo anos escolares (N = 1.260.159). Os pesquisadores adotaram modelos hierárquicos de idade, período e coorte, e mediram os sintomas depressivos por meio de um questionário com quatro perguntas.

Os sintomas depressivos das meninas diminuíram entre 1991 e 2011, mas aumentaram em 2018. Não houve efeito coorte, pois houve um aumento em todos os grupos. Nos meninos, a tendência foi parecida, mas o aumento foi menos marcante quando comparado com as meninas. Os sintomas depressivos estão aumentando entre os adolescentes, especialmente entre as meninas.

Para lembrar:

Os adolescentes devem receber um olhar especial em relação às condições como os transtornos do humor. Além da adolescência ser um momento de muitas mudanças orgânicas e psicológicas, o uso de redes sociais pode dificultar ainda mais esse período da vida. Estas questões precisam ser vistas como novos fatores de risco de sintomas depressivos e episódios de humor.

Artigo publicado no Medscape em 09 de dezembro de 2019