Eletroconvulsoterapia, não eletrochoque!
A decisão do Ministério da Saúde de financiar a compra de aparelhos de eletroconvulsoterapia (ECT) abriu uma grande discussão na sociedade sobre os benefícios ou não desta técnica, utilizada há muito tempo.
Este procedimento já foi utilizado como método de tortura no passado, porém hoje para sua realização é necessário um centro cirúrgico e anestesia geral. Até mesmo o termo eletrochoque se tornou pejorativo. Não apenas a grande maioria do público leigo desconhece o procedimento, mas a classe médica também padece de muita falta de informação sobre o assunto.
A ECT é um tratamento bastante seguro e com muitas evidências científicas sobre o seu uso, tanto em transtornos psicóticos como em transtornos do humor. Duas revisões recentes trazem informações importantes. A primeira aborda o uso na esquizofrenia. Esta revisão de 2018 incluiu apenas estudos feitos em 2017 e concluiu, por meio de múltiplos estudos de diferentes países e de metanálises, que existem fortes evidências da potencialização dos antipsicóticos pela ECT. Os estudos analisados nesta revisão mostraram que os efeitos cognitivos da ECT são moderados e passageiros. Alguns estudos demonstraram melhora da cognição após o procedimento. A ECT bilateral foi o mais utilizado nesta revisão e a diferença do local do eletrodo parece ser algo menor.
A outra revisão mencionada apresenta evidências importantes sobre o uso de ECT em transtornos do humor. Para pacientes com transtornos do humor, a ECT tem sido utilizada desde 1938, sendo um tratamento efetivo, com respostas girando entre 70% e 80%, ou seja, mais altas do que as respostas com antidepressivos. A ECT é um tratamento agudo, e não de manutenção. As indicações da ECT em pacientes com transtornos do humor estão normalmente relacionadas a questões de urgência, como pacientes com necessidade de resposta rápida ao tratamento, com risco de suicídio e com catatonia.
A ECT é considerada hoje um tratamento seguro e eficiente, utilizado em muitos países, como Estados Unidos, França e Alemanha. O procedimento precisa transpor o preconceito da população leiga e médica para ser colocado em prática. Campanhas informativas sobre este tratamento devem ser realizadas para que a população entenda como ele é realizado e quais são os seus benefícios, assim como os seus efeitos colaterais. O que sabemos é que tanto a ECT quanto a psiquiatria em geral hoje não são mais bichos de sete cabeças.
Artigo publicado no Medscape em 27 de fevereiro de 2019