Revisão busca associar uso de cigarros eletrônicos e de maconha entre jovens
Associação entre uso de cigarros eletrônicos e maconha
O uso de cigarros eletrônicos entre jovens de 10 a 24 anos de idade aumentou substancialmente nos últimos cinco anos. Nos Estados Unidos, um terço dos jovens nos últimos anos do segundo grau relatam já ter usado cigarro eletrônico.
Até pouco tempo pensava-se que os cigarros eletrônicos eram mais seguros que os cigarros tradicionais, mas pesquisas mostram o contrário. O aerossol destes dispositivos contém altos níveis de nicotina, metais pesados e carcinógenos. Além disso, estudos recentes têm mostrado uma forte associação entre cigarros eletrônicos e consumo de bebidas alcoólicas, maconha e outras drogas.
Pacientes com transtornos mentais e comportamentais devidos ao uso de múltiplas drogas e ao uso de outras substâncias psicoativas geralmente começam a consumir estas substâncias antes dos 18 anos, e mais de 95% dos usuários iniciam antes dos 25 anos. Adolescentes e adultos jovens, cujo cérebro está em desenvolvimento, são mais vulneráveis que adultos a se tornarem dependentes de nicotina, bebidas alcoólicas, maconha e outras drogas.
Foi conduzida uma revisão sistemática e uma metanálise para caracterizar e quantificar a associação entre o uso de cigarros eletrônicos e de maconha entre adolescentes e adultos jovens. Os autores aventaram que o consumo de maconha seria maior entre os usuários de cigarros eletrônicos, e entre os adolescentes.
Os estudos analisados incluíam jovens de 10 a 24 anos de idade e comparavam usuários de cigarro eletrônico com não usuários. Foram incluídos estudos transversais e longitudinais. Dentre os 835 estudos inicialmente identificados, 21 foram selecionados. A metanálise incluiu 3 estudos longitudinais e 18 transversais, somando 128.227 participantes.
As taxas de consumo de maconha foram maiores entre jovens usuários de cigarros eletrônicos (razão de chances ou odds ratio, OR, de 3,47; intervalo de confiança, IC, de 95%, de 2,63 a 4,59) – tanto nos estudos longitudinais como nos transversais: OR = 2,43; IC 95%, de 1,51 a 3,90; OR = 3,70; IC 95%, de 2,76 a 4,96, respectivamente. As taxas de consumo de maconha entre jovens de 12 a 17 anos usuários de cigarros eletrônicos foram maiores do que entre adultos jovens de 18 a 24 anos: OR = 4,29; IC 95%, de 3,14 a 5,87; OR = 2,30; IC 95% de 1,40 a 3,79, respectivamente.
Para lembrar:
É de extrema importância que se tomem medidas para dificultar o acesso a cigarros eletrônicos entre jovens, pois, como podemos constatar através desta metanálise, este grupo tem um risco três vezes maior de iniciar o uso de maconha. Também é importante conscientizar os responsáveis por adolescentes de que, mesmo que a maconha seja legalizada, esta não é uma droga segura para jovens com o cérebro em desenvolvimento.
O pensamento acelerado revisitado: uma dimensão-chave da ativação no transtorno afetivo bipolar
Pensamentos acelerados se referem a um aumento subjetivo da velocidade e à produção exacerbada de pensamentos, associado a episódios de mania/hipomania em pacientes com transtorno afetivo bipolar (TAB).
Apenas a última edição o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-5, sigla do inglês, Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders) reconheceu que os pensamentos acelerados ocorrem como especificadores de “características mistas” em episódios depressivos e de mania/hipomania.
De acordo com o DSM-5, os especificadores de “características mistas” podem ser aplicados quando três sintomas do polo oposto que não se sobreponham ocorrerem junto com um episódio de depressão maior ou de mania/hipomania. Entre os sintomas que não se sobrepõem, os pensamentos acelerados têm sido constantemente relacionados com as características mistas na depressão.
Alguns estudos sugerem que este seria o sintoma central presente em até 89% dos pacientes. A identificação dos pensamentos acelerados, junto com o humor deprimido, pode evitar importantes consequências no tratamento, entendendo que as “características mistas” estão associadas a um aumento na ideação suicida e a baixa resposta a antidepressivos.
Este estudo investiga as propriedades psicométricas do questionário sobre pensamentos rápidos e sobrecarregado (RCTQ) e a sua capacidade de diferenciar episódios depressivos típicos de episódios mistos em pacientes com TAB.
Estudos anteriores mostraram que os médicos normalmente não reconhecem sintomas do polo oposto predominantemente em episódios depressivos ou maníacos. Isto ocorre devido à específica fenomenologia dos episódios mistos, incluindo aumento da ansiedade e pensamentos acelerados.
Além disso, o diagnóstico torna-se ainda mais difícil devido aos sintomas em comum entre a mania e a depressão (falta de foco, irritabilidade e agitação psicomotora), que foram excluídos dos especificadores de características mistas. O atual critério diagnóstico apresenta falta de sensibilidade, permitindo o diagnóstico de depressão mista apenas em um entre quatro casos.
Estudos recentes mostram que a presença de menos sintomas concorrentes do polo oposto (por exemplo, pontuação > 2 na escala de mania de Young) tem uma especificidade e sensibilidade maior que os atuais critérios diagnósticos do DSM-5 para depressão com características mistas.
Esses estudos propuseram e validaram outras características, focando na ativação psíquica na depressão, argumentado que os critérios do DSM-5 falharam em reconhecer os sintomas que definem a depressão mista (irritabilidade, tensão e agitação psicomotora).
Dois tipos de pensamentos acelerados foram identificados em estudos de fenomenologia em pacientes com transtornos do humor: pensamento acelerado, associado a humor maníaco, e pensamento sobrecarregado, associado a humor depressivo.
A fenomenologia do pensamento acelerado e do pensamento sobrecarregado parece ser diferente. Pensamentos acelerados são caracterizados por uma rápida inundação de pensamentos, normalmente associados a humor exaltado. O pensamento sobrecarregado é descrito como um excesso de informações na cabeça dos pacientes, e está associado a uma funcionalidade prejudicada. Os pensamentos sobrecarregados normalmente são descritos em quadros de depressão, mas também podem ser vistos em quadros mistos.
O objetivo deste estudo foi avaliar a validade e a confiabilidade da escala RCTQ em pacientes com TAB e em controles saudáveis. Se a escala capturar pensamentos ativados especificamente associados a humor maníaco, então a pontuação deve ser maior em episódios maníacos e mistos do que em episódios depressivos e eutímicos.
O estudo tem particular interesse em discriminar depressão mista e não mista.
Foram incluídos 221 pacientes com TAB e 120 controles saudáveis. Todos foram avaliados pelas escalas de YMRS (mania), QIDS-C16 (depressão) e RCTQ para ruminação, preocupação e ansiedade.
Três grupos foram operacionalizados de acordo com a pontuação da escala YMRS, sendo pontuação > 2, < 6 e 1 ou 2 respectivamente para depressão mista e depressão não pura, e YMRS = 0 para depressão pura. Fatores de análise confirmatória mostraram que o modelo de três fatores da RCTQ produziu os melhores índices, e removeu itens redundantes, resultando em um questionário com 13 itens.
Hipomania e ansiedade foram os preditores com maior pontuação. Já ruminação não pareceu ser um preditor significativo. Os resultados da RCTQ foram maiores nos grupos com depressão mista e não pura, quando comparados com os de depressão pura.
Para lembrar:
A avalição da alteração da velocidade do pensamento é de extrema importância no exame do estado mental de qualquer paciente, seja no consultório ou na emergência. Com este dado é possível fazer o diagnóstico de episódios mistos, e assim evitar o uso de antidepressivos, que são extremamente deletérios para estes pacientes, podendo até mesmo aumentar as ideações suicidas nesses casos.
Nível sérico ideal para o lítio na manutenção do transtorno afetivo bipolar: uma revisão sistemática e recomendações
O uso do lítio foi aprovado na Europa e na América do Norte há mais de 45 anos, e é considerado o tratamento de primeira linha para o transtorno afetivo bipolar (TAB) na maioria das diretrizes.
Entretanto, esse medicamento tem um intervalo curto entre a dose terapêutica e a dose tóxica. O índice terapêutico do lítio é 2. As revisões recomendam diferentes intervalos de níveis de lítio para a manutenção do TAB, algumas recomendam de 0,4 mmol/L a 0,8 mmol/L e outras de 0,6 mmol/L a 1,0 mmol/L.
O maior problema das diferentes recomendações é que faltam grandes estudos, bem desenhados, para avaliar os níveis séricos ideais – principalmente estudos que equilibrem eficácia e tolerabilidade para a maioria dos pacientes.
A revisão mais recente sobre os níveis ideais de lítio para manutenção do tratamento do TAB identificou cinco estudos com amostras pequenas. Além disso, a revisão indica que faltaram alguns questionamentos importantes.
Uma força-tarefa da International Society for Bipolar Disorders e do International Group for The Study of Lithium Treated Patients (ISBD/IGLSI) foi designada para estabelecer um consenso sobre os níveis séricos de lítio para a manutenção do TAB, utilizando o método Delphi, que consiste no envio de questões clínicas e afirmações para que especialistas respondam.
Com os critérios de inclusão estritos não houve a inclusão de nenhum estudo. Foram incluídos sete estudos selecionados pelo objetivo da revisão. Destes, quatro estudos sugerem melhor eficácia do lítio entre 0,45 e 0,60 até 0,8 a 1,0 mmol/L. Estes dados suportam os achados da pesquisa Delphi.
Para idosos não houve consenso, mas a maioria dos membros endossou uma abordagem mais conservadora, normalmente entre 0,4 mmol/L e 0,6 mmol/L, com a opção de aumentar até 0,7 mmol/L ou 0,8 mmol/L em pacientes entre 65 e 79 anos, e usar no máximo 0,7 mmol/L em pacientes acima de 80 anos.
Para lembrar:
A dosagem de lítio é importante para a boa prática clínica. Com o surgimento dos estudos ecológicos, onde se entende que o lítio tem efeitos terapêuticos mesmo em microdoses, o clínico pode focar no limite superior do nível sérico, para fins de toxicidade. Para o nível inferior é importante que se use a resposta clínica/efeitos colaterais como parâmetro. A dosagem do nível sérico é importante para adesão, principalmente nos idosos, onde o intervalo e muito mais estreito.
Artigo publicado no Medscape em 10 de outubro de 2019